AMAR

Andrew Atroshenko:
Andrew Atroshenko

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e mal amar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.
(Carlos Drummond de Andrade



3 comentários:

  1. Linda tela e poesia! Bem escolhidas! beijos, ótimo dia! chica

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  2. Amar e ser amado neste mundo com tanta falta de amor ,muitos beijinhos querida amiga.

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  3. Ah, este Drummond tinha uma inspiração maravilhosa.
    Amar o amor.
    Linda partilha amiga.
    Abraços.

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